Érico Firmo
Brincando, mas com a seriedade típica dos que fazem riso com a política, Millôr Fernandes costuma dizer que é contrário tanto à extrema-direita quanto à extrema-esquerda, mas, sobretudo, é contra o “extremo centro“. E essa última é justamente a tendência política cada vez mais em voga no Brasil.
Na tentativa de se contrapor à polarização entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), Marina Silva (PV) flerta com elementos clássicos da terceira via. O problema que o third way tupiniquim sempre enfrentou foi o fato de que faltam extremos para tentar conciliar.
O centro, no Brasil, é um território congestionado. Não há espaço para ultrapassagem pelo meio. O eleitor brasileiro sempre foi considerado um sujeito meio de centro. Pelo menos, foi esse segmento que tem recorrentemente decidido as eleições.
As vitórias de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) consolidaram uma avaliação de que o eleitorado pode ser dividido em três faixas.
Um terço estaria propenso a votar, em qualquer circunstância, na centro-esquerda. No PT e em Lula, digamos assim.
Outro terço penderia para a centro-direita, DEM-PSDB. E haveria outro terço capaz de decidir a eleição para quem melhor souber seduzi-lo. Os tucanos perceberam isso depressa. Os petistas, um pouco mais tarde. A estratégia de ambos foi abandonar radicalizações e buscar espaço no meio. As duas forças que mutuamente mais se antagonizam na política nacional estão se esbarrando ideologicamente o tempo todo nesse campo amorfo do centrismo.
Ciro Gomes (PSB) tentou e fracassou no projeto de crítica à polarização PT-PSDB e busca de uma alternativa a ambos os caminhos.
Marina segue pela mesma trilha. O problema é que falta antagonismo real de ideias. Há, é inegável, diferenças de práticas administrativas. Mas não há diferenças teóricas mais profundas, que delimitem campos políticos realmente distintos.
Como disse certa vez Cristovam Buarque (PDT), nas Páginas Azuis do O POVO, Marx ficaria horrorizado se soubesse que, no Brasil, o que caracteriza ser de esquerda é querer juros mais baixos.
Basta perceber que, no debate entre os dois líderes da corrida presidencial, a oposição busca desmentir o tempo todo qualquer coisa que possa soar como intenção de mudança de rumos. Falam que manterão tudo que está sendo feito, e vão ainda melhorar. Enquanto os governistas apontam o dedo e dizem: “Eles não gostam do Bolsa Família“ ou “eles não gostam do PAC“.
É uma discussão que só se justifica pelo pragmatismo da percepção de que essas políticas são aprovadas. Mas, ideologicamente, o debate é completamente maluco, pois quem defende a ideia é que aponta que há pensamento contrário, enquanto quem seria contra garante que é, na verdade, a favor.
Não é algo novo. Quando Lula venceu pela primeira vez, em 2002, fez uma carta para prometer ao mercado que não mudaria praticamente nada, só melhoraria o que já estava lá.
O caminho dos extremos
Se os dois candidatos apontados como radicais antagonistas fazem de tudo para ocultar as diferenças & quase sempre com sucesso & Marina, ao tentar não se contrapor nem a um, nem a outro, acaba fazendo um discurso insípido e sem cara.
Na economia, diz que não fará mudanças significativas. Sobre os temas polêmicos, como aborto ou casamento de homossexuais, encontrou a solução fácil de propor plebiscito para tudo, como estratégia para não precisar se posicionar. Marina já tem uma tarefa inglória de romper uma polarização que parece inevitável. Com mais experiência e cacife, Ciro Gomes fracassou na mesma tentativa.
No Brasil, o caminho que resta para a terceira via é o dos extremos. A terceira via apostou na moderação como proposta política para uma época de radicalização, na Guerra Fria. Em tempos de “extremismo centrista“, como o Brasil de hoje, o caminho que resta livre é pelas pontas.